2011/02/25

O exemplo dos porcos

Neste ambiente em que nos cavam um buraco financeiro empréstimo a empréstimo, o PR continua a achar que não está em causa o regular funcionamento das instituições

Há tempos um amigo confessava-me que se sentia identificado com os porcos: os cães olhavam-no de baixo, os gatos de cima, mas os porcos é que o tratavam como igual. Lembrei-me disto ao analisar a actuação do governo. Um governo que só tem olhos para o TGV e encerra linhas ferroviárias umas atrás das outras, isolando cada vez mais o interior, pensa certamente que todos preferem deslocar-se por estrada tal como os ministros. Um governo que aposta em ditadura atrás de ditadura para prioridade da diplomacia económica, Magalhães aqui, Magalhães ali, admite seguramente que os portugueses partilham os mesmos valores que Sócrates. Um governo que recorre a habilidade contabilística atrás de habilidade contabilística, venha mais um fundo de pensões para Europa ver, assine-se mais uma parceria para as próximas gerações pagarem, acredita sem dúvida que os eleitores, tal como os seus membros, não aprendem com os erros.

Neste ambiente em que nos cavam um buraco financeiro empréstimo a empréstimo, o Presidente da República continua a achar que não está em causa o regular funcionamento das instituições. Resta-nos por isso fingir perante os nossos credores, até 10 de Março, que nada de especial se passa. E rezar para que, nesse dia, algum partido tenha o bom senso de apresentar uma moção de censura minimalista para ser aprovada por toda a oposição sem excepção: “este governo é mau de mais, basta!”

Depois das eleições, e em face dos rumores que anunciam a preferência de Passos Coelho por um executivo com poucos ministros, fico esperançado numa actuação menos dispersa, logo mais incisiva no essencial. Que aposte na complementaridade com a sociedade civil e concretize uma limpeza geral no Estado. É que eu simpatizo com cães, gatos e porcos, mas preferia não ser obrigado a viver numa pocilga.

(publicado no JN de 2011/02/24)

2011/02/11

Ah Valente!

A Agência para o Desenvolvimento das Indústrias Criativas, sexta-feira dia 18 no Porto, vai desafiar a iniciativa privada para a reabilitação urbana “low-cost”

Apesar do peso sufocante do Estado, há sempre quem insista em que faça mais, qualquer coisa mais, para vencer a crise. Preferia que o Estado deixasse de tentar ajudar, a não ser cumprindo bem as funções que exclusivamente lhe cabem. Se se constatam tantas falhas em serviços essenciais, tão grave falta de recursos, é inaceitável que disperse a atenção por outras áreas, com prejuízo de prioridades mais altas.

Por exemplo, para quê agitar agora o ambiente escolar, destruindo eventualmente organizações que estão a funcionar bem, só para que escolas públicas substituam privadas? As privadas em causa não estão a prestar adequadamente o serviço público? Se não estão, por que razão não foram já encerradas? Ao contrário, se há resposta suficientemente boa da sociedade civil neste campo, para quê procurar um duvidoso óptimo antes de resolver o que está comprovadamente mal noutros que não são assumidos por ela?

Ainda mais flagrante é a eterna insistência do Governo em actuar na área da economia, com intervenções dirigidas às PME, à exportação, à agricultura, aos “clusters” mais diversos, ao emprego, às mulheres, aos jovens... Insucesso atrás de insucesso. Receio que esta postura tenha origem nas frustrações de quem é gestor assalariado, quando gostava de ser empresário ou empreendedor social mas não tem perfil nem coragem para isso.

A Agência para o Desenvolvimento das Indústrias Criativas, sexta-feira dia 18 no Porto, vai desafiar a iniciativa privada para a reabilitação urbana “low-cost”. Como sempre, o mais difícil é encontrar detentores de capital próprio com abertura de espírito para estudar um negócio novo. Valente de Oliveira afirmou há dias, contra todas as evidências, que é simples obter capital para pequenos projectos. Espero que ele compareça, estou ansioso por aprender.

(publicado no JN de 2011/02/10)