2012/01/31

Ainda a Lei das Rendas

Depois de tomar conhecimento dos pormenores da proposta do Governo para a nova Lei das Rendas, a minha opinião é agora bastante mais crítica do que a que exprimi em Dezembro. É que as excepções são tantas, que muitos senhorios vêem-se na prática, durante mais 6 ou 7 anos, "voluntariados" para prestar apoio social que compete ao Estado. Vejamos.

1) Será eventualmente consensual que há alguns arrendatários que devem ser apoiados, por razões diversas. Isso implica um custo, real, que alguém vai suportar. Se não for o Estado a fazê-lo, alguém arcará com esse peso.

2) Não faz sentido serem os senhorios a assumir-se como Segurança Social. Atirar o custo desse apoio só para eles é de uma cobardia miserável, sem qualquer base ética minimamente aceitável. É como se o buraco do BPN fosse empurrado para os cidadãos de Bragança, por exemplo, isentando o resto do país. Ou se o défice da Madeira devesse ser pago apenas pelos engenheiros, dispensando as restantes profissões do esforço a que ele obriga. Só se explica esta proposta porque seguramente quem a formulou não pensou bem no que estava a fazer.

3) Sendo assim, o dinheiro tem de vir de algum lado. Se não é só dos proprietários, então tem de ser de todos nós, via Estado. O Estado tem de encontrar verbas para este apoio com diminuição de outras despesas ou com mais impostos. Evidentemente que prefiro o primeiro caso. Mesmo sabendo que falta informação sobre os contratos antigos, algumas simulações simples garantem que o montante máximo em causa é, por exemplo, bastante inferior aos exemplos do BPN e da Madeira dados acima.

Mas repito: sob nenhum pretexto o Estado tem o direito de obrigar apenas uma parte dos cidadãos a suportar custos que são encargo de todos. A Assembleia da República ainda vai a tempo de corrigir isto.

2012/01/06

O imposto sobre as facas

O Projecto de Lei 118/XII do PS (e aparentemente apoiado também por deputados de outros partidos), sobre a Cópia Privada e os Direitos de Autor, é uma completa aberração. Presume que quando alguém possui um dispositivo electrónico com memória, como um disco rígido de um computador ou um telemóvel, o vai utilizar para cópia abusiva de música, vídeos ou outras peças sujeitas a direito de autor. E por isso estipula uma taxa para compensar os artistas supostamente vítimas do eventual crime... Diga-se que o mesmo disparate já ocorre no caso de CDs e fotocópias.

Além do valor alucinado da taxa proposta (há casos em que provocaria aumentos de preço da ordem dos 20% a 50% ou mesmo, com a rápida evolução tecnológica, bastante mais), coloca-se principalmente a questão de princípio da presunção de culpa.

Se se considera que existe de facto bastante pirataria e que os artistas são prejudicados, eventuais e polémicos apoios compensatórios deveriam quando muito sair do Orçamento de Estado. Por que razão alguém que compra um disco externo para guardar as suas fotografias pessoais, ou os vídeos caseiros da família, há-se pagar uma taxa para direitos de autor de obras alheias das quais nunca usufruiu?

Quando se adquire uma obra sujeita a direitos de autor, o valor que é pago vai de facto para os detentores de direitos daquela obra concreta. No caso de uma taxa cega como a proposta, para quem vai o dinheiro? É impossível criar regras de distribuição minimamente justas pois, sendo pirataria o que está em causa, é impossível saber quais os autores que deveriam ser compensados e qual a medida dessa compensação. Isto faz-me lembrar o político que há poucos dias propunha como solução para aumento de receita do Estado a taxação da economia paralela...

Se esta proposta for aprovada, sugiro então que se crie também um imposto sobre a venda de facas, para compensar as vítimas de assaltos com arma branca.

PS (2011/02/04) - Uma correcção que ia ficando esquecida: afinal a presunção não é de que a cópia é abusiva, mas apenas "cópia privada", permitida por lei. Não se altera, de qualquer modo, a questão aqui levantada, pois essa presunção é inaceitável. Qual a alternativa, então? Não é necessária nenhuma alternativa, ou seja, o preço da obra já deve ser estabelecido atendendo à possibilidade de efectuar "cópia privada". Se o detentor dos direitos de autor quiser aumentar o preço atendendo a isso, que o faça. Se não quiser, que o mantenha. É aliás polémico que a "cópia privada" prejudique o detentor dos direitos de autor.