2010/04/23

A barreira nocturna dos Aliados

Uma solução, contudo, já foi proposta publicamente pelo Arq.º Pulido Valente: concentrar os dois sentidos de trânsito na faixa de rodagem a poente

No passado fim de semana participei numa visita à Baixa e ao Centro Histórico do Porto entre as onze da noite e as três da madrugada (publiquei breve registo em www.porto.taf.net). As pessoas ligadas à Faculdade de Letras que simpaticamente a organizaram, e que têm estudado com pormenor o que se passa na cidade, confirmaram os receios que sinto já há longo tempo: a Avenida dos Aliados divide vincadamente a “noite” do lado Oriental e a “noite” do lado Ocidental, prejudicando a vivência que seria possível sem esta barreira. Mesmo durante o dia, as recentes alterações impostas por Siza e Souto Moura induziram um aumento do tráfego automóvel, o que só por si desqualifica a zona.

Uma solução, contudo, já foi proposta publicamente pelo Arq.º Pulido Valente: concentrar os dois sentidos de trânsito na faixa de rodagem a poente e deixar a via a nascente, numa configuração semelhante à da Rua do Bonjardim em frente ao Rivoli, reservada para peões e transportes públicos. Criar-se-á assim um espaço contínuo desde a Praça D. João I, tornando viável o uso da placa central dos Aliados para esplanadas e promovendo a sua ocupação no dia-a-dia, que não apenas no S. João, nas vitórias do FCPorto ou nas vindas do Papa.

Não se compreende também o total desleixo nocturno nos locais mais frequentados. Praça Filipa de Lencastre, Rua Galeria de Paris, Travessa de Cedofeita e locais adjacentes são depósitos de copos de plástico ou urinóis ao ar livre. O estacionamento é caótico. A câmara e as juntas de freguesia que se entendam para actuar em coordenação: trata-se até de poupar dinheiro, pois a vigilância 24h por dia evita custos bem mais altos de limpeza e reparação posterior dos estragos. Todos ficarão beneficiados. Assim como agora está, isto não é usar o espaço público na movida, é confiscá-lo.

(publicado no JN de 2010/04/22)

2010/04/09

Nuclear: sempre os mesmos erros

Em vez de apostar na oferta de energia, é preferível investir um montante equivalente na redução da procura, com resultados decerto até mais compensadores

A hipótese de construção de uma central nuclear em Portugal só se explica porque quem a defende, estando de boa fé, se entusiasmou com o assunto sem reflectir bem nele.

1) Por menor que seja o risco, um acidente numa central nuclear pode ter consequências absolutamente catastróficas. Temos centrais aqui à nossa beira em Espanha, mas "perdidos por cem, perdidos por mil" não é argumento. Além de falha técnica ou humana, há sempre vulnerabilidade a acções terroristas - que belo alvo!

2) A energia produzida por uma central nuclear é barata. É. Se não considerarmos os custos de tratamento e armazenagem (por uma eternidade, literalmente) dos resíduos radioactivos para os quais, aliás, não há nenhuma boa solução. Se não considerarmos os custos de vigilância e prevenção de acidentes/atentados. Etc, etc.

3) Vamos confiar no Estado para gerir um processo destes? Vamos entregar os estudos ao mesmo tipo de especialistas que defendeu a Ota ou o TGV? Não venham dizer que se consegue fazer tudo com investimento privado, porque é inevitável grande envolvimento público, directo ou indirecto.

4) Em vez de apostar na oferta de energia, é preferível investir um montante equivalente na redução da procura, com resultados decerto até mais compensadores.

5) Uma central nuclear em Portugal, e em particular no Douro onde já se chegou a ameaçar, arruina completamente a imagem de ambiente de qualidade que pretendemos "vender". Já se calculou o custo disso?

6) Enquanto houver alternativas, mesmo que "mais caras" numa análise simplista, a prudência impõe soluções diferentes. Talvez se consiga adiar por algumas dezenas de anos o recurso à fissão nuclear produzida localmente (nem que seja recorrendo à importação de energia!), até que esteja disponível a tecnologia de fusão nuclear, essa sim limpa e segura.

(publicado no JN de 2010/04/08)