Em vez de apostar na oferta de energia, é preferível investir um montante equivalente na redução da procura, com resultados decerto até mais compensadores
A hipótese de construção de uma central nuclear em Portugal só se explica porque quem a defende, estando de boa fé, se entusiasmou com o assunto sem reflectir bem nele.
1) Por menor que seja o risco, um acidente numa central nuclear pode ter consequências absolutamente catastróficas. Temos centrais aqui à nossa beira em Espanha, mas "perdidos por cem, perdidos por mil" não é argumento. Além de falha técnica ou humana, há sempre vulnerabilidade a acções terroristas - que belo alvo!
2) A energia produzida por uma central nuclear é barata. É. Se não considerarmos os custos de tratamento e armazenagem (por uma eternidade, literalmente) dos resíduos radioactivos para os quais, aliás, não há nenhuma boa solução. Se não considerarmos os custos de vigilância e prevenção de acidentes/atentados. Etc, etc.
3) Vamos confiar no Estado para gerir um processo destes? Vamos entregar os estudos ao mesmo tipo de especialistas que defendeu a Ota ou o TGV? Não venham dizer que se consegue fazer tudo com investimento privado, porque é inevitável grande envolvimento público, directo ou indirecto.
4) Em vez de apostar na oferta de energia, é preferível investir um montante equivalente na redução da procura, com resultados decerto até mais compensadores.
5) Uma central nuclear em Portugal, e em particular no Douro onde já se chegou a ameaçar, arruina completamente a imagem de ambiente de qualidade que pretendemos "vender". Já se calculou o custo disso?
6) Enquanto houver alternativas, mesmo que "mais caras" numa análise simplista, a prudência impõe soluções diferentes. Talvez se consiga adiar por algumas dezenas de anos o recurso à fissão nuclear produzida localmente (nem que seja recorrendo à importação de energia!), até que esteja disponível a tecnologia de fusão nuclear, essa sim limpa e segura.
(publicado no JN de 2010/04/08)