2009/10/23

Obesidade associativa

Vale a pena fazer “lobby” transparente e construtivo

Gostava que um dia me explicassem devagarinho qual o benefício para Portugal, no contexto em que vivemos, da existência de associações de empresários como a AEP, a AIP, a CIP, a ANJE, a das PMEs, etc., etc. Quais os fins que pretendem realmente atingir? Vejo 3 áreas onde, no imediato, vale a pena fazer “lobby” transparente e construtivo.

1) Reforma do sistema de Justiça: a primeira das prioridades. Sem estarem a funcionar saudavelmente as regras de interacção entre os cidadãos e destes com o Estado, é impossível aplicar com eficácia outras reformas. Um exemplo: num país saudável as vítimas dos calotes da Administração Pública poderiam obter reparação em tempo útil.

2) Simplificação drástica de leis e de regulamentos técnicos. A menos que estejam em causa valores fundamentais como a segurança de pessoas e bens, ou o respeito pela liberdade e pela concorrência leal, as normas recomendariam certificação opcional em vez de imporem requisitos obrigatórios. Isto removeria, só por si, grande carga dos tribunais, do Estado e das autarquias locais, poupando à iniciativa privada recursos preciosos para o fomento da economia. A corrupção deixaria de ter tantos pretextos para se instalar.

3) Reorganização territorial com aplicação equilibrada do investimento público. Se insistirmos na actual manta de retalhos administrada por uma multidão de funcionários mal chefiados, é impossível atingirmos uma produtividade que não nos envergonhe. Continuaremos a sofrer o resultado do centralismo irracional com que pactuamos há décadas, sem participação cívica significativa.

Melhorias nestes pontos seriam bênçãos para empresários que se prezem. Se a fusão da AEP e da AIP ajudar a manter vivas estas prioridades até que haja mudanças reais em Portugal, então vale a pena. Mas não faz sentido tratar de outros assuntos agora. Basta um pequeno número de especialistas motivados para este trabalho, dispensando-se as pesadas estruturas brutalmente endividadas e parasitas de apoios públicos. Fundam-se, mas emagreçam de forma radical!

(publicado no JN de 2009/10/22)

2009/10/09

Rui, mas o Sá

A cidade não deve, repetindo o erro, empurrar a sua esperança para o próximo presidente da Câmara

O Porto é um falso mistério. A crise tem razões e culpados: decisores portuenses com grandes qualidades pessoais mas, enquanto no poder, incapazes de planear o futuro sem a muleta do Estado; empresários cuja medida de sucesso é o quão baixo conseguem pagar em vez do valor que acrescentam; uma geração avarenta na gestão dos bens e medrosa nas relações sociais. Fechámo-nos sobre nós próprios, pensámos cada vez mais pequenino. E desgraçámo-nos.
A cidade não deve, repetindo o erro, empurrar a sua esperança para o próximo presidente da Câmara. Mas a autarquia, mesmo com meios limitados, pode tratar do ordenamento do território em coordenação com os concelhos vizinhos (com os quais deveria preparar a fusão), administrar o seu património imobiliário e cultural, reunir esforços privados em actividades que beneficiem o Porto.

Rui Rio, em quem votei no primeiro mandato, teve oito anos para perceber isto. Só em parte o conseguiu. Com uma acção por vezes meritória, estragou-a ao deixar de assimilar os sinais negativos que resultavam das suas falhas, o que o impediu de as corrigir. O corte sob fraco pretexto do magro subsídio aos cantoneiros, violando o compromisso da Câmara, foi a gota de água: assim não serve. Ao esconder o contrato do Aleixo e outros documentos supostamente públicos, lá se foi a transparência...

Elisa Ferreira era uma esperança, mas manteve um discurso agressivo que divide a cidade entre pró-Rio e contra-Rio. Não é por aí. Faltou-lhe também uma “política de verdade” que a demarcasse do PS anterior. O seu trabalho de federação das elites tem valor e deve, em qualquer caso, ser aproveitado.

Vou repetir o voto em Rui Sá, mesmo não concordando com todas as suas propostas - trabalhador, disponível para procurar soluções sensatas com outros partidos, o menos demagógico dos candidatos, o que melhor conhece o Porto. Em resumo, é tempo de mudar para alguém que perceba que esta citação é humorística: “There’s really no point in listening to other people. They’re either going to be agreeing with you or saying stupid stuff” – “Dilbert”, Scott Adams.

(publicado no JN de 2009/10/08)