Em vez de protestar contra o pagamento nas SCUT devíamos mudar de casa para passar a habitar perto do emprego
Portugal às vezes é de compreensão lenta. Acabou o dinheiro. Aquilo que até agora desperdiçávamos vai ter de ser aproveitado. O uso da inteligência é uma necessidade absoluta, já não apenas conveniência. O mal afecta principalmente algumas “forças de bloqueio”, das quais destaco dois tipos.
O primeiro é constituido pelos pais que dedicam ao futebol uma atenção inversamente proporcional aos hábitos de poupança e rigor que incutem nos filhos em idade escolar. Queixam-se de Sócrates (e com razão) sem consciência de que o imitam, deseducando. Ao segundo tipo pertencem os “investidores” que não investem, “só quando a crise passar”. Claro que o verdadeiro problema deles não é a crise, mas a própria incompetência revelada na incapacidade de perceber onde estão as oportunidades de negócio. Como consolação resta-lhes o bom senso de não arriscar o capital acumulado, pois iriam certamente desbaratá-lo nestes tempos que os transcendem.
Há dias, ao visitar uma horta no centro da cidade, mostraram-me a beldroega, uma planta que eu não sabia identificar. Fez-me recordar os acampamentos em que na adolescência participei com o grupo de jovens a que pertencia, onde aprendíamos a viver com pouco. Ao mudar de ambiente éramos levados a reflectir sobre os recursos de que dispúnhamos, o uso que lhes dávamos, e a nossa quota-parte de responsabilidade na gestão do mundo. E assim, por causa da beldroega, fiquei mais convencido de que em vez de protestar contra o pagamento nas SCUT devíamos mudar de casa para passar a habitar perto do emprego, e que em vez de procurar propostas de bons negócios devíamos investir o nosso tempo a criá-las, e que em vez de lutar pela regionalização contra o Governo podíamos tratar melhor da nossa cidade dando dimensão adequada e ferramentas eficazes às freguesias.
(publicado no JN de 2010/06/17)
2010/06/18
2010/06/04
Criativos não-praticantes
As “indústrias criativas” não existem. O que existe é criatividade nas indústrias, e nos serviços também.
A minha paciência para teoria sobre “indústrias criativas” já se esgotou. As “indústrias criativas” não existem. O que existe é criatividade nas indústrias, e nos serviços também. Há um ano escrevi sobre a ameaça dos “encarregados de educação” do empreendedorismo alheio que não arriscam eles próprios criar o seu negócio, sublinhando que criatividade passará pelas novas modas digitais mas também por necessidades como reabilitação urbana, apoio social, funcionamento da justiça, simplificação de regulamentos...
Não haverá criatividade que chegue para fazer baixar o estacionamento automóvel irregular? Nenhuma alma inventiva descobrirá maneira de aproveitar os espaços urbanos com capacidade agrícola? Com tantos desempregados ociosos, ninguém conseguirá organizar acções (ao menos de voluntariado) onde eles tenham interesse em ser úteis? A desocupação e degradação do edificado dos centros urbanos é um problema complexo demais para estas “indústrias”? Uma cidade não passa a ser atractiva pelo facto de haver animações avulsas do espaço público, umas vezes bem conseguidas, outras nem por isso. Nem se provoca impacto económico sensível no país com mais meia dúzia de micro-empresas ou associações temáticas sem nenhum potencial para atingirem grande dimensão.
A inovação está provavelmente muito mais no talento para pegar em ideias simples (se calhar já antigas e por isso pouco "fashion") que sejam eficazes. Ou seja, a capacidade criativa tem de estar embebida na economia “normal”, nas relações sociais, nas nossas rotinas, e não num mundo à parte onde mentes iluminadas lançam ideias para outros eventualmente colherem. Neste contexto, vale a pena medir os resultados da acção de entidades como a ADDICT. A criatividade chegou ao menos para estabelecer critérios de avaliação? Divulguem-se.
(publicado no JN de 2010/06/03)
A minha paciência para teoria sobre “indústrias criativas” já se esgotou. As “indústrias criativas” não existem. O que existe é criatividade nas indústrias, e nos serviços também. Há um ano escrevi sobre a ameaça dos “encarregados de educação” do empreendedorismo alheio que não arriscam eles próprios criar o seu negócio, sublinhando que criatividade passará pelas novas modas digitais mas também por necessidades como reabilitação urbana, apoio social, funcionamento da justiça, simplificação de regulamentos...
Não haverá criatividade que chegue para fazer baixar o estacionamento automóvel irregular? Nenhuma alma inventiva descobrirá maneira de aproveitar os espaços urbanos com capacidade agrícola? Com tantos desempregados ociosos, ninguém conseguirá organizar acções (ao menos de voluntariado) onde eles tenham interesse em ser úteis? A desocupação e degradação do edificado dos centros urbanos é um problema complexo demais para estas “indústrias”? Uma cidade não passa a ser atractiva pelo facto de haver animações avulsas do espaço público, umas vezes bem conseguidas, outras nem por isso. Nem se provoca impacto económico sensível no país com mais meia dúzia de micro-empresas ou associações temáticas sem nenhum potencial para atingirem grande dimensão.
A inovação está provavelmente muito mais no talento para pegar em ideias simples (se calhar já antigas e por isso pouco "fashion") que sejam eficazes. Ou seja, a capacidade criativa tem de estar embebida na economia “normal”, nas relações sociais, nas nossas rotinas, e não num mundo à parte onde mentes iluminadas lançam ideias para outros eventualmente colherem. Neste contexto, vale a pena medir os resultados da acção de entidades como a ADDICT. A criatividade chegou ao menos para estabelecer critérios de avaliação? Divulguem-se.
(publicado no JN de 2010/06/03)
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