Neste ambiente em que nos cavam um buraco financeiro empréstimo a empréstimo, o PR continua a achar que não está em causa o regular funcionamento das instituições
Há tempos um amigo confessava-me que se sentia identificado com os porcos: os cães olhavam-no de baixo, os gatos de cima, mas os porcos é que o tratavam como igual. Lembrei-me disto ao analisar a actuação do governo. Um governo que só tem olhos para o TGV e encerra linhas ferroviárias umas atrás das outras, isolando cada vez mais o interior, pensa certamente que todos preferem deslocar-se por estrada tal como os ministros. Um governo que aposta em ditadura atrás de ditadura para prioridade da diplomacia económica, Magalhães aqui, Magalhães ali, admite seguramente que os portugueses partilham os mesmos valores que Sócrates. Um governo que recorre a habilidade contabilística atrás de habilidade contabilística, venha mais um fundo de pensões para Europa ver, assine-se mais uma parceria para as próximas gerações pagarem, acredita sem dúvida que os eleitores, tal como os seus membros, não aprendem com os erros.
Neste ambiente em que nos cavam um buraco financeiro empréstimo a empréstimo, o Presidente da República continua a achar que não está em causa o regular funcionamento das instituições. Resta-nos por isso fingir perante os nossos credores, até 10 de Março, que nada de especial se passa. E rezar para que, nesse dia, algum partido tenha o bom senso de apresentar uma moção de censura minimalista para ser aprovada por toda a oposição sem excepção: “este governo é mau de mais, basta!”
Depois das eleições, e em face dos rumores que anunciam a preferência de Passos Coelho por um executivo com poucos ministros, fico esperançado numa actuação menos dispersa, logo mais incisiva no essencial. Que aposte na complementaridade com a sociedade civil e concretize uma limpeza geral no Estado. É que eu simpatizo com cães, gatos e porcos, mas preferia não ser obrigado a viver numa pocilga.
(publicado no JN de 2011/02/24)