2010/06/18

A culpa é da beldroega

Em vez de protestar contra o pagamento nas SCUT devíamos mudar de casa para passar a habitar perto do emprego

Portugal às vezes é de compreensão lenta. Acabou o dinheiro. Aquilo que até agora desperdiçávamos vai ter de ser aproveitado. O uso da inteligência é uma necessidade absoluta, já não apenas conveniência. O mal afecta principalmente algumas “forças de bloqueio”, das quais destaco dois tipos.

O primeiro é constituido pelos pais que dedicam ao futebol uma atenção inversamente proporcional aos hábitos de poupança e rigor que incutem nos filhos em idade escolar. Queixam-se de Sócrates (e com razão) sem consciência de que o imitam, deseducando. Ao segundo tipo pertencem os “investidores” que não investem, “só quando a crise passar”. Claro que o verdadeiro problema deles não é a crise, mas a própria incompetência revelada na incapacidade de perceber onde estão as oportunidades de negócio. Como consolação resta-lhes o bom senso de não arriscar o capital acumulado, pois iriam certamente desbaratá-lo nestes tempos que os transcendem.

Há dias, ao visitar uma horta no centro da cidade, mostraram-me a beldroega, uma planta que eu não sabia identificar. Fez-me recordar os acampamentos em que na adolescência participei com o grupo de jovens a que pertencia, onde aprendíamos a viver com pouco. Ao mudar de ambiente éramos levados a reflectir sobre os recursos de que dispúnhamos, o uso que lhes dávamos, e a nossa quota-parte de responsabilidade na gestão do mundo. E assim, por causa da beldroega, fiquei mais convencido de que em vez de protestar contra o pagamento nas SCUT devíamos mudar de casa para passar a habitar perto do emprego, e que em vez de procurar propostas de bons negócios devíamos investir o nosso tempo a criá-las, e que em vez de lutar pela regionalização contra o Governo podíamos tratar melhor da nossa cidade dando dimensão adequada e ferramentas eficazes às freguesias.

(publicado no JN de 2010/06/17)