Se depois das eleições vier um governo competente, não será esse curto período transitório causador de maior mal do que aquele ao qual já não nos escapamos
Uma das últimas teorias para justificar a manutenção, ainda que penosa, do governo de José Sócrates é a que nos tenta assustar com perigos de um governo de gestão. Ai que as eleições não se podem realizar imediatamente, ai que há medidas urgentíssimas que teriam de ser adiadas, ai o que seria da nossa fama nos mercados financeiros internacionais!
Mas afinal onde está o mal? Se agora continuam a ser tomadas medidas erradas, se o orçamento está longe de ser bom, se não se inverteu o descalabro, se insistem nas manobras contabilísticas para esconder dívidas do Estado, o que temos a perder? Pode acontecer que o custo de financiamento externo aumente a pique durante poucos meses mas, se depois das eleições vier um governo competente, não será esse curto período transitório causador de maior mal do que aquele ao qual já não nos escapamos. Pelo contrário, mais vale uma cura dolorosa mas rápida do que um contínuo resvalar para a desgraça.
Acredito que seria possível obter apoio alargado na Assembleia da República, enquanto se esperam eleições, para um governo com funções equivalentes às de um de gestão com um significativo acrescento: a melhoria da Justiça (incluindo simplificação radical de leis e regulamentos). Estando obrigado a concentrar-se neste assunto que é a primeira prioridade para Portugal, e relativamente ao qual o consenso será viável, aposto que um Executivo de programa assim minimalista proporcionará até excelentes resultados.
Nota final: a entrevista de Sousa Tavares a Sócrates fez-me lembrar a de Judite de Sousa a Rui Rio – se não é confrontado (e não foi) com argumentos bem sistematizados e totalmente inquestionáveis, um político profissional como estes acaba por ser “branqueado” aos olhos dos seus apoiantes por um entrevistador que facilitou no trabalho de casa.
(publicado no JN de 2010/02/25)
2010/02/26
2010/02/12
Alforrecas
Não há estabilidade que justifique a manutenção de um caminho errado com gente indigna do cargo que ocupa - estabilidade em direcção ao abismo?
Generalizemos, cometendo com isso algumas injustiças: o cidadão comum está mole. Exige das figuras públicas padrões de comportamento a que ele próprio não se sujeita quando menos exposto a olhares alheios. A vivência num ambiente de ética degradada diminui o seu discernimento, a sua capacidade de indignação. As pequenas malandrices enquanto cidadão comum são precisamente a escola que prepara as acções em grande escala dignas de escroques que as circunstâncias da vida tornaram possíveis a alguns.
O que fazer quando as instituições parecem esboroar-se? Actuar com eficácia talvez cruel (pois a avaliação que se faz não é, nem deve ser, do âmbito rigoroso da Justiça), escolhendo rapidamente novos protagonistas. Não há estabilidade que justifique a manutenção de um caminho errado com gente indigna do cargo que ocupa - estabilidade em direcção ao abismo? O argumento de que sem uma alternativa na manga não se deve arriscar uma mudança é um resto do inevitável lastro cultural salazarista, que impele os representantes do povo a agir como se fossem seus “encarregados de educação”. A alternativa só se materializa em face da oportunidade, na medida da necessidade concreta. Uma solução aparecerá quando tiver mesmo de aparecer. Não se adie mais.
A “política de verdade” proposta, mas não praticada, pela actual direcção do PSD é um requisito essencial para qualquer governo nestas circunstâncias. Convém portanto haver memória clara do que nos trouxe a este ponto e das equipas responsáveis por isso, em especial executivo PS e oposição PSD. Quem pertenceu a essas equipas poderá certamente desempenhar papel útil no futuro, mas não haja ilusões de que essas mesmas pessoas possuem capacidade para liderar o esforço de inverter a desgraça em que estamos a cair. É altura de outra gente no PS e no PSD.
(publicado no JN de 2010/02/11)
Generalizemos, cometendo com isso algumas injustiças: o cidadão comum está mole. Exige das figuras públicas padrões de comportamento a que ele próprio não se sujeita quando menos exposto a olhares alheios. A vivência num ambiente de ética degradada diminui o seu discernimento, a sua capacidade de indignação. As pequenas malandrices enquanto cidadão comum são precisamente a escola que prepara as acções em grande escala dignas de escroques que as circunstâncias da vida tornaram possíveis a alguns.
O que fazer quando as instituições parecem esboroar-se? Actuar com eficácia talvez cruel (pois a avaliação que se faz não é, nem deve ser, do âmbito rigoroso da Justiça), escolhendo rapidamente novos protagonistas. Não há estabilidade que justifique a manutenção de um caminho errado com gente indigna do cargo que ocupa - estabilidade em direcção ao abismo? O argumento de que sem uma alternativa na manga não se deve arriscar uma mudança é um resto do inevitável lastro cultural salazarista, que impele os representantes do povo a agir como se fossem seus “encarregados de educação”. A alternativa só se materializa em face da oportunidade, na medida da necessidade concreta. Uma solução aparecerá quando tiver mesmo de aparecer. Não se adie mais.
A “política de verdade” proposta, mas não praticada, pela actual direcção do PSD é um requisito essencial para qualquer governo nestas circunstâncias. Convém portanto haver memória clara do que nos trouxe a este ponto e das equipas responsáveis por isso, em especial executivo PS e oposição PSD. Quem pertenceu a essas equipas poderá certamente desempenhar papel útil no futuro, mas não haja ilusões de que essas mesmas pessoas possuem capacidade para liderar o esforço de inverter a desgraça em que estamos a cair. É altura de outra gente no PS e no PSD.
(publicado no JN de 2010/02/11)
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