Preocupação social sensata não é limitar o máximo que alguém pode ganhar, mas sim maximizar o que recebe o mais desfavorecido
Multiplicam-se as movimentações para conquistar o direito de gerir património alheio. A vários anos de distância, sugerem-se nomes para a presidência da Câmara do Porto, transformada em assunto nacional por causa da corrida perdida da Red Bull; os meios regionalistas nortenhos animam-se com a esperança de que um novo partido, ele sim diferente dos outros, conquiste um nível de governo local; até um respeitado bispo, num entusiasmo reivindicativo, reclama 20% do salário de uma classe profissional muito desacreditada.
Comum a tudo isto é o esquecimento da acção individual a nível privado, empurrando os problemas para os recursos do Estado ou de outrem. Custa-me debater candidaturas a funções públicas sem pensar no projecto em que aí se deverá trabalhar. Custa-me ver um potencial partido esgotar a sua missão na exigência de uma reorganização territorial, quando esse objectivo poderia ser defendido transversalmente dentro das várias forças políticas já existentes. Custa-me “confiscar” 20% seja lá do que for aos políticos, e não também aos engenheiros, aos advogados, aos pescadores, aos membros do clero, ou até aos falsos recibos verdes que Serralves agora acabou por reconhecer. Preocupação social sensata não é limitar o máximo que alguém pode ganhar, mas sim maximizar o que recebe o mais desfavorecido.
Eis um exemplo, não inédito, de uma reunião de esforços que só depende da vontade dos intervenientes: criar um fundo privado de gestão de arrendamentos que vença a relutância dos proprietários em passarem a ser senhorios, garantindo-lhes uma receita segura (mesmo que não muito alta) e isolando-os das imperfeições do sistema de justiça. Vamos acabar por descobrir que, apesar de tudo, ainda temos dinheiro a mais e só quando o perdermos não restará outro remédio senão sermos racionais.
(publicado no JN de 2010/07/29)