2004/09/09

Perguntas esquecidas

O tema do Aborto continua a provocar o aparecimento de comentários e opiniões sem qualquer suporte lógico ou racional.

No caso do referendo de 1998 podia-se considerar que existiam dois lados em oposição porque havia uma pergunta concreta a exigir uma resposta de SIM ou NÃO. Contudo, neste momento é totalmente inadequado dividir os cidadãos entre os defensores do SIM e os do NÃO. Existem inúmeros "lados", todos com posições e justificações diferentes. A bipolarização que surgiu demonstra ignorância, falta de rigor, deficiente capacidade de análise.

Há uma pergunta que se impõe mas que raramente é feita e muito menos respondida. Quase todos os "lados" defendem, em abstracto, que as mulheres que abortam "não devem ir para a prisão", independentemente de o aborto ser considerado ou não um crime. Mas: e quanto ao prazo, isso não será relevante para uma decisão quanto à penalização a aplicar?

Pergunta-se a quem defende a descriminalização até às 12 semanas (porque é supostamente "criminoso" prender uma mulher por esse motivo): e se uma mulher em boa situação económica e familiar abortar aos 7 meses, por exemplo, já deve ser presa? A resposta é quase sempre o silêncio. Julgo que há duas razões para isso. A primeira é o incómodo de confessar que se defende a prisão para alguns casos de irresponsabilidade mais grave. A segunda é que por vezes se apoia, sem o assumir, a total liberalização do Aborto independentemente do prazo, até ao nascimento.

A minha opinião já aqui foi explicada de forma clara: qualquer caso não autorizado por lei deve ser levado a tribunal. Se geralmente a prisão é desadequada, excepcionalmente poderá ser justificada. Havendo pais capazes de maltratar os filhos das formas mais inacreditáveis, por que fenómeno estatístico é que no caso do aborto não haveria também algumas situações que merecessem penas duras?

Outro aspecto esquecido é a penalização dos outros intervenientes que não a mulher. As clínicas que praticam abortos clandestinos não o fazem certamente por altruísmo. É um negócio sórdido. Não merecem prisão os seus responsáveis?