2009/08/05

Mania de complicar

Se quando nos perguntam a opinião sobre um assunto respondermos a respeito de outro, de que nos queixamos?

É errado o hábito de usar uma eleição com um fim específico para "dar sinal" de outra coisa qualquer. Se no próximo domingo formos avaliar o Governo nacional, em que ocasião escolheremos os deputados para o Parlamento Europeu e o projecto que defendem? E nas autárquicas, vamos votar na nossa representação local, ou "enviaremos recados" para mais longe? Nas legislativas, avaliaremos as propostas a nível nacional, ou estaremos a premiar/punir as estruturas partidárias locais?

É contudo saudável avaliar o resultado das acções/inacções do Governo naquilo que está relacionado com a Europa para confrontar as candidaturas (e não apenas os cabeças-de-lista) com as suas ideias para o Parlamento Europeu. Mas para chumbar o Governo é nas legislativas - não perde por esperar. Se quando nos perguntam a opinião sobre um assunto respondermos a respeito de outro, de que nos queixamos?

A vontade dos cidadãos é progressivamente ignorada: houve um largo consenso para, sob vários pretextos, nos negarem a possibilidade de votar o Tratado de Lisboa. Não terá sido o caso mais grave neste caminho forçado para a Europa, mas a ilegibilidade daquele amontoado de artigos é motivo bastante para o recusar. Querem avançar para uma Europa melhor? Tornem-na compreensível. Tornem-na simples. Convençam-nos.

Compreende-se a abstenção como reflexo da indignação generalizada. Mas é combater um mal com outro mal: como se distingue o cidadão indignado do cidadão desleixado? A "abstenção responsável" é o voto em branco, pois inequivocamente mostra descontentamento. Há uma sugestão excelente mas nunca aproveitada: a abstenção e os votos em branco deveriam "eleger deputados". Por exemplo, 40% de abstenção significaria 40% de cadeiras vazias no Parlamento. Eis uma maneira simples de criar nos deputados forte interesse na participação política dos cidadãos! Aposto que com esta nova regra os próximos tratados seriam milagrosamente fáceis de entender, as leis mais bem preparadas, a prestação de contas bem cuidada.

(publicado no JN de 2009/06/04)